quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Entenda polêmica sobre a proibição de biografias não-autorizadas

A polêmica sobre a publicação de biografias está no Supremo Tribunal Federal. A Associação Nacional dos Editores de Livros - Anel - entrou, no ano passado, com uma ação questionando dois artigos do Código Civil.
Um dos artigos determina que é preciso autorização para a publicação ou uso da imagem de uma pessoa. E que a divulgação de escritos, a transmissão, publicação ou exposição poderão ser proibidas se atingirem a honra, a boa fama, a respeitabilidade ou se tiverem fins comerciais. O outro artigo diz que a vida privada é inviolável.
A Associação dos Editores alega que a necessidade de autorização prévia é uma forma de censura. E que isso ataca  a Constituição, que prevê a liberdade de expressão e o direito à informação. Os editores pedem que o supremo declare a inconstitucionalidade parcial dos artigos, deixando claro que não deve haver autorização prévia para a publicação de biografias.
Os biógrafos defenderam o direito à liberdade de expressão. Em artigos publicados no jornal O Globo, disseram que a difamação deve ser punida pela Justiça. João Máximo, autor da biografia de Noel Rosa, afirmou: "Processe-se o biógrafo que injurie, calunie, difame ou fira a verdade em qualquer medida; mas respeite-se o que, ao biografar seriamente um homem público brasileiro contribua, de alguma forma, para contar um pouco da história do Brasil".
O escritor Laurentino Gomes disse: "Deixem que jornalistas, escritores e biógrafos trabalhem. Se eles mentirem ou cometerem injustiças, que sejam punidos de acordo com a lei. Mas sem censura".

O assunto é tão controverso que a relatora do caso, ministra Carmen Lúcia, decidiu realizar uma audiência pública, no fim de novembro, para ouvir os diferentes pontos de vista. O objetivo das palestras é ajudar os ministros a tomar posição sobre um assunto que, nos últimos meses, provocou um intenso debate entre artistas, que se posicionaram contra e a favor de biografias não autorizadas. Só depois das audiências é que o caso será julgado.

Por meio da associação Procure Saber, um grupo de artistas defende que as biografias precisam de autorização para serem publicadas. Mas afirmam que essa postura nada tem a ver com censura. Desse grupo fazem parte, entre outros, Roberto Carlos, Caetano Veloso e Chico Buarque.
Há seis anos, Roberto Carlos conseguiu, com uma ação na Justiça, proibir a biografia "Roberto Carlos em detalhes", escrita por Paulo César de Araújo, alegando invasão de privacidade. O caso foi lembrado em meio à polêmica sobre as biografias.
Em artigo no jornal O Globo, Chico Buarque defendeu o direito de Roberto Carlos preservar sua vida pessoal. E negou que tivesse dado entrevista para o livro de Paulo César Araújo.
Disse Chico Buarque: "Lamento pelo autor, que diz ter empenhado 15 anos de sua vida em pesquisas e entrevistas com não sei quantas pessoas, inclusive eu. Só que ele nunca me entrevistou".

Mas o autor comprovou a existência da entrevista com Chico Buarque, gravada em vídeo, que Paulo César divulgou na internet.

Chico Buarque reconheceu o engano. "No meio de uma entrevista de quatro horas, 20 anos atrás, uma pergunta sobre Roberto Carlos talvez fosse pouco para me lembrar que contribuí para sua biografia. De qualquer forma, errei e por isto lhe peço desculpas".

Outro que se manifestou foi Caetano Veloso. Também em artigo no jornal O Globo, ele disse: "Por que me somo a meus colegas mais cautelosos da associação Procure Saber, que submetem a liberação das obras biográficas à autorização dos biografados? Aprendi, em conversas com amigos compositores, que, no cabo de guerra entre a liberdade de expressão e o direito à privacidade, muito cuidado é pouco".

O presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, também já se manifestou sobre o assunto. Ele disse: "O ideal seria liberdade total de publicação, com cada um assumindo os riscos. Quem causar dano deve responder financeiramente". Barbosa defende o pagamento de multas para quem ofender a honra ou a privacidade de um biografado.

A professora de direito constitucional da Uerj Ana Paula de Barcellos acha que as biografias não devem ser submetidas à autorização prévia. Mas também considera importante proteger a privacidade do biografado. E explica que no caso de abusos, como calúnia ou difamação, a Justiça é quem dá a palavra final.

“Não precisam de autorização, mas elas devem respeitar a intimidade e a vida privada das pessoas. E diante de um conflito, quer dizer, o Judiciário é que vai resolver, que vai avaliar e com a possibilidade de mandar tirar, se for o caso, mandar proibir ou, e/ou,  determinar uma indenização, enfim. Aí diante do caso concreto o judiciário vai avaliar”, analisa Ana Paula.
O ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, Carlos Veloso, considera que as biografias precisam ser autorizadas se abordarem a intimidade de pessoas públicas e no caso de artistas ele defende autorização prévia sempre.

“A pessoa pública que não é agente público ele tem o direito de dizer que não quero ser biografado. Eu acho que isso me parece normal. E com relação, então, ao direito, à intimidade e à privacidade, aí eu penso que é necessária a autorização”, disse Carlos Veloso, ministro aposentado do STF.  
O Congresso também entrou na polêmica das biografias. Um projeto em tramitação na Câmara acaba com a necessidade de autorização para a divulgação de imagens e informações com finalidade biográfica.
Uma proposta de emenda ao projeto prevê ainda que a pessoa que se sentir atingida poderá pedir à Justiça a retirada do trecho que conseguir provar que é ofensivo à honra. Mas, apenas em reedições da obra. O projeto ainda precisa ser votado na Câmara e no Senado. (G1/Redação)

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